TV Saudade: O salto dos anos 2000 - Parte 1
Tamanho, complexidade e diversidade; as séries dos anos 2000 levaram a televisão para um outro patamar de audiência, de investimentos e transformou programas de TV em verdadeiras superproduções.
O século XXI chegou e apesar de o público ainda estar na crista da onda dos anos 90 a exigência era cada vez maior, a televisão aberta estava ficando cada vez mais limitada e os canais fechados, com certa liberdade, se aproveitaram da situação e capturaram uma boa fatia do público. O começo do novo milênio traria novidades para televisão como 24 Horas repleta de ação, os mistérios de Lost e os canais fechados ousariam bem com A Sete Palmos / Six Feet Under e Dexter, era o início da chamada “Era de Ouro” da televisão.
Mafiosos divisores de águas
Se vamos falar da “Era de Ouro” e da virada no mundo televisivo, vamos começar pela “série chave” para esses acontecimentos, Família Soprano / The Sopranos (HBO, 1999-2007) criado, por David Chase, mostrava os ‘bastidores’ da máfia em Nova Jersey, estado vizinho a Nova Iorque. O chefe da família é Tony Soprano (James Gandolfini, em uma atuação soberba), ele está sentindo algumas dores e constantes desmaios, até que é aconselhado por seu médico a fazer terapia, chefe da máfia, ele obviamente fica relutante com a ideia, mas segue com ela, sua analista é a Dra. Jennifer Melfi (Lorraine Braco) que de início não sabe absolutamente nada sobre seu novo paciente, partindo daí somos tragados para a vida e o cotidiano de Tony. Tráfico de drogas, prostituição, roubos de carro, de carga e outros muitos delitos.
Lidar com a família da máfia é o menor dos problemas de Tony, pois seu real impasse está dentro de sua casa. Sua esposa Carmela (Eddie Falco) é uma dona de casa frustrada, seus dois filhos Meadow (Jamie-Lynn Sigler) e Anthony Jr. (Robert Iler), são adolescentes que ultrapassam a linha do rebelde, sem contar a própria mãe de Tony, Livia (Nancy Marchand), uma senhora que começa sofrer com Alzheimer, mas que tem o histórico de “mãe maldosa”.
A série, no decorrer de seis temporadas caprichou no desenvolvimento de cada um dos inúmeros personagens, é gigantesco o desenvolver, conquistando muitos prêmios no Emmy, é provável que 90% do elenco tenha sido premiado.
Curiosidades:
The Sopranos foi a primeira série de um canal fechado (HBO) a ganhar o Emmy de melhor série drama
A HBO achava que o nome The Sopranos remetia algo relacionado a música, por isso no logo da série a letra P é um revólver.
A Justiça ganhou as telas
O nome David E. Kelley é um dos mais recorrentes aqui na Dossiê etc, criador de algumas das séries mais marcantes, o criador e roteirista sempre soube se adaptar às exigências do público. Justiça Sem Limites / Boston Legal (ABC, 2004-2008) se revelou como um dos mais divertidos e elaborados projetos de Kelley, a série tem uma premissa muito simples, Alan Shore (James Spader, na melhor atuação da história da televisão americana, sem exageros) acaba de ser demitido do escritório de advocacia onde gerou milhões de dólares em novas contas. Inconformado com a decisão dos chefes, ele contrata Denny Crane (Wiliam Shatner), um dos grandes nomes do setor, mas que vive às sombras de sua fama. O encontro resulta na contratação de Alan para trabalhar no escritório de Denny, até aí tudo bem, mas ainda na primeira temporada o escritório sofre uma reviravolta com a entrada de uma das sócias majoritárias, Shirley Schmidt (Candice Bergen), uma advogada repleta de novas regras, o circo estava armado, já que Alan faz tudo, menos respeitar as regras.
O diferencial da série eram os casos bizarros que caíam nas mãos dos advogados. Uma série muito divertida, muito bem escrita e que levou um novo tipo de direção aos episódios, repleta de closes e zoom, sou suspeito para falar, já que essa é uma das minhas séries favoritas.
Curiosidades:
Boston Legal é a série favorita do ex-presidente americano Bill Clinton;
Os diálogos e situações viviam brincando e fazendo referências ao Capitão Kirk (Star Trek) que William Shatner interpretou nos anos 60.
Agentes do Governo
Os policiais sempre foram protagonistas em dezenas de séries americanas, Lei e Ordem / Law & Order (1990 a 2010) popularizou ainda mais esse gênero, mas nos anos 2000 houve uma explosão e a polícia em vários seguimentos foram colocados na televisão.
O que seria o combate ao crime sem os agentes do FBI que muitas vezes mais parecem super-heróis, Desaparecidos / Without a Trace (CBS, 2002-2009) mostrava os agentes do FBI que procuravam pessoas desaparecidas, como o próprio título sugere. A série parte da ideia de que a melhor forma de encontrar uma pessoa que sumiu do mapa, é conhecer bem a vítima, como ela pensava e agia. A série mostrava essa linha do tempo mostrando há quantas horas a suposta vítima estava desaparecida.
Já Mentes Criminosas / Criminal Minds (CBS, 2005-2020) mostrava outro segmento, o da Divisão de Ciência do Comportamento. A cada episódio os agentes analisavam a mente dos criminosos mais perigosos do país, tentando antecipar seus próximos passos, para assim, tentarem salvar uma vítima.
CSI (CBS, 2000-2015) é uma daquelas séries que chegam de mansinho, não impressionam de primeira, mas que no decorrer dos anos e das temporadas vai crescendo e crescendo, o programa segue o trabalho dos investigadores forenses do Departamento de Polícia de Las Vegas enquanto eles revelam as circunstâncias por trás de mortes e crimes pouco comuns.
O sucesso da série foi tanto que vários derivados foram criados como CSI: Miami; CSI: New York; CSI: Las Vegas e todos eles fizeram sucesso em algum nível.
O maior sucesso policial da década de 2000 ficou conhecido por um nome, Jack Bauer (Kiefer Sutherland), o protagonista de 24 Horas / 24 (FOX, 2001-2014), uma série com um “formato diferente”, cada temporada narrava um dia na vida do agente – daí o nome 24 horas – cada episódio era o equivalente a uma hora na vida do protagonista; assim cada temporada tinha 24 episódios, a série ficou muito popular, essencialmente, por causa do formato da trama e do roteiro bem amarrado. Aqui no Brasil a Globo fez uma bela propaganda da série e a exibiu, utilizando cada segundo de sucesso da série.
Curiosidades:
Para manter a fidelidade ao visual dos personagens, todos os atores da série 24 Horas cortavam o cabelo a cada cinco dias
A série recebeu duras críticas por conta das cenas de tortura, usada pelos agentes do governo estadunidense, inclusive praticadas pelo protagonista Bauer.
Empoderamento Feminino:
Joan Girardi (Amber Tamblyn) acaba de se mudar para a pequena cidade de Arcadia, o que era para ser um novo capítulo de sua pacata vida, por decisão de seus país que passaram por uma série de problemas e precisam recomeçar em uma nova cidade, se transforma em um encontro com Deus, que se apresentava a ela de diversas formas. A cada encontro a força divina passava uma nova tarefa para a estudante, essa era a premissa de Joan of Arcadia (CBS, 2003-2005) criada por Barbara Hall que queria abordar o adolescente comum e sua falta de crença em forças maiores.
J.J Abrams foi nos anos 2000 um dos grandes nomes no mundo televisivo, criador de várias séries naquela década, entre elas Codinome Perigo / Alias (ABC, 2001-2006) que nasceu de outra série dele Felicity (The WB, 1998-2002), sobre uma garota apaixonada que vai estudar na cidade grande para ficar próximo de seu amado. Parece simples, não é? Mas quem conhece J.J. Abrams sabe que ele jamais se limitaria a isso, é então que nós, expectadores, descobrimos que a jovem apaixonada vive uma vida dupla como agente secreta do serviço americano, só para deixar claro, estamos falando de Alias.
Na série, Sidney Bristow (Jennifer Garner) trabalha numa organização chamada SD-6, um braço da CIA. A cada episódio ela era enviada para desmembrar planos mirabolantes de vilões ainda mais mirabolantes, isso quando Abrams, como é de costume não enfiava goela abaixo coisa para lá de ficção cientifica.
O público jamais se esquecerá de uma personagem, que é até hoje usada como referência, Betty Suarez, mais conhecida como Betty: A Feia aqui no Brasil.
A trama fez sucesso em vários países, do Brasil aos EUA passando por México e adjacências, não seria diferente, Betty: A Feia / Ugly Betty (ABC, 2006-2010) tinha a mesma trama que já conhecemos: Uma garota introvertida que trabalha numa das maiores publicações de moda dos Estados Unidos. Ela usa óculos de grau, aparelho dos dentes e roupas sem estilo, especialmente ponchos, uma caricatura daqui que os roteiristas consideram “feio”, mas inteligência é a sua maior arma e ela usa isso e o pouco charme que tem para cativar seus colegas, aliás, não só os colegas, como o público, a crítica e o chefe.
Super Heróis, Super Poderes, Super Humanos e Super Efeitos Especiais
O "SuperBoy" exigia certa paciência do público mais exigente, mas a DC que até então não tinha conseguido emplacar seus personagens em séries de televisão, mesmo com inúmeras tentativas nos anos 50, agora nos anos 2000 a garotada ficava horas em frente da televisão, já que a internet ainda estava se instalando e o canal The WB, futuramente The CW, era focado em séries para o “público jovem” – eis que a DC entra em ação e tenta emplacar um herói, deu certo.
Smallville (The CW, 2001-2011) contava as aventuras de Clark Kent (Tom Welling) no período que morava com os pais na cidade título e ainda estava descobrindo seus poderes, fenômeno entre os jovens – apesar de ser ruim de doer – e foi apenas a primeira de inúmeras séries de heróis que surgiriam na próxima década.
Heroes (NBC, 2006-2010) foi um caso muito, muito estranho, na onda dos super-heróis, Tim Kring criou essa série, que mostrava várias pessoas comuns em vários cantos do planeta descobrindo poderes, a primeira temporada foi um sucesso estrondoso, indicada ao Emmy de melhor série drama, episódios bem escritos, dirigidos, um elenco bom, surpreendente, primeiro ano excelente, mas, de repente, na volta da segunda temporada, tudo desandou de forma que o público pensasse: o que raios aconteceu? A série se perdeu completamente, meteu os pés elas mãos, criando tramas que não faziam sentido, personagens com poderes estranhos, a audiência foi ao chão, ainda assim, a série ficou no ar por quatro anos.
O público passeou por hospitais e flertou com os médicos
Plantão Médico / ER permaneceu no ar até 2009, mas a série já estava desgastada, o público gostava de séries médicas e queria séries novas. Com o público sedentos pela renovação desse tipo de série, três novas foram ao ar. Com um cinismo peculiar e a filosofia de que todo paciente mente, o Dr. Gregory House (Hugh Laurie) foi um dos médicos que conquistaram a audiência, House (FOX, 2004-2012) foi um sucesso, o doutor não deixava nenhuma evidência de lado e não se preocupava em arriscar sua reputação. O tipo de personagem que incomoda a pessoa que vos fala, pois é aquele chato que está sempre certo e não aceita “perder” em uma discussão, mas o protagonista era a essência da série, todo o sucesso era devido a ele.
Shonda Rhimes foi mais um dos nomes que explodiu nos anos 2000, sua primeira empreitada para a televisão, continua no ar até hoje, sinal que o público ainda gosta, porque dá audiência. Estou falando de Grey’s Anatomy (ABC, 2005-presente), a série está atualmente na décima oitava temporada e teve seu elenco reformulado várias vezes, a série mostra o cotidiano “peculiar” dos médicos do Seattle Hospital. Eu sinceramente acho um dramalhão, uma verdadeira novela e me desculpa quem gosta, mas sinceramente...
Ainda nos anos 2000 que parecem não ter fim, Ryan Murphy colocava no ar sua segunda série, ele ficaria extremamente popular na década seguinte, aliás, é o atual nome mais “forte” da televisão. Estética / Nip/Tuck (FX, 2003-2010) acontecia em uma clínica de cirurgias plásticas, fazendo uma dura e sarcástica crítica a esse seguimento da medicina. Os donos da clínica Sean McNamara (Dylan Walsh) e Christian Troy (Julian McMahon) eram parceiros, mas com personalidades totalmente diferentes, no começo de cada episódios um deles perguntava ao paciente “me diga o que você não gosta em você” – partindo disso vários dilemas pessoas entravam em cena. O primeiro sucesso de Murphy já mostrava como seria sua carreira, começaria todas as séries seguintes de forma brilhante, mas no decorrer das temporadas só cairia, até ficarem completamente ruins.
São muitas séries, não dá para colocar tudo em um único texto, semana que vem, falamos das comédias, das famílias dos anos 2000, de boas ideias que foram canceladas, da censura e tantas outras séries, calma que tem muito mais, até semana que vem.
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