Excelentíssimo Sr. Dr. Kassio Nunes, ouça Gilberto Gil
Atualizado: 6 de abr. de 2021
Não precisa ir ao templo para falar com Deus, Ministro! E, para quem não sabe como rezar fora da igreja, Gilberto Gil ensina, mas fique em casa.
“Reconheço que o momento é de cautela, ante o contexto pandêmico que vivenciamos. Ainda assim, e justamente por vivermos em momentos tão difíceis, mais se faz necessário reconhecer a essencialidade da atividade religiosa, responsável, entre outras funções, por conferir acolhimento e conforto espiritual”
afirma o Ministro.
Excelentíssimo Senhor Doutor Ministro Kassio Nunes, Gilberto Gil já nos ensinou que, se quiser falar com Deus, fique a sós, apague a luz, cale a voz, encontre a paz que, certamente, por ser o Pai Maior onipresente e onisciente, ele o escutará. Essa comunicação prescinde dos nós de gravata, de sapatos e das contas bancárias daqueles que se arvoram mediadores entre o fiel e Deus.
Mas, o Ministro Doutor ignorou os ensinamentos dessa belíssima canção e optou por acolher o pedido proposto por Juristas evangélicos, concedendo a possibilidade de templos religiosos descumprirem os decretos municipais que exigem o fechamento de todas as atividades não essenciais e facultando, dessa forma, que os fiéis se aglomeram e se contaminem para falar com Deus!
É verdade que a Constituição Federal determina, em seu art 5º, inciso VI, o direito à liberdade religiosa e, consequentemente, de exercer esses direitos em locais específicos para tal. Entretanto, nenhum direito, em hipótese alguma, pode ser considerado absoluto. Nem mesmo o direito à vida que, em ocasiões extremas como o risco de óbito da parturiente e do filho, opta-se pela vida de um ou de outro.
Mas, certamente, ao estudarmos a Constituição Federal, percebemos que o direito à vida não é absoluto, mas é prioritário em termos de proteção, pela nossa Carta Cidadã. Afrontar esse bem maior, ou expô-lo a risco em templos e igrejas, macula preceitos básicos de nosso sistema jurídico, dentre eles: nenhum direito está acima do direito à vida!
Pode contra argumentar, a caríssima leitora ou leitor, que ir ou não a esses templos é um ato, por completo, volitivo e que só irão expor suas vidas os que considerarem tal ação pertinente, uma vez que, não se manifesta forçosa a presença em templos e igrejas.
Concordo. Não há a obrigatoriedade da presença, mas as vidas dos que não optaram por estar lá encontram-se em risco. Basta pensarmos que a transmissão não cessará nos que, de maneira aglomerada, demonstram suas crenças. Infelizmente, o vírus irá se espalhar e fortalecer-se, eventualmente, atingindo aquele que optou por falar com Deus ao modo de Gilberto Gil. Ou mesmo, a vida daquele que, não crendo, jamais iria, em atual momento pandêmico, (presencialmente) a um templo. Pergunto-lhes, é justo? Creio que não. E os que não expuseram suas vidas, poderão ter negado seu direito de serem atendidos por um sistema de saúde ocupado por outros que optaram por flertar com a morte. É justo?
De toda forma, de acordo com a nossa Constituição, não somos apenas um Estado de Direito, mas sim, Estado Social e Democrático de Direito, de modo que o Estado deve intervir para proibir que os desejos individuais estejam acima dos direitos coletivos. Por Estado entende-se, inclusive, poder judiciário. Que vergonha, Ministro!
Outro argumento utilizado pelo Excelentíssimo foi “o caráter filantrópico promovido por tais instituições”. A esse, ninguém melhor para responde do que o respeitadíssimo Senhor Padre Júlio Lancelotti que dedicou sua vida, inclusive ao longo da pandemia, para acolher aqueles desprovidos e famélicos.
“Só pode ser de alguém que coloca o lucro acima da vida. Não adianta ter culto religioso e não ter dignidade da vida”.
Disse o, de fato cristão, Padre Lancelloti.
Por fim, Excelentíssimo Senhor Doutor, ouça mais Gilberto Gil e acolha menos os interesses financeiros daqueles que mercantilizam a fé, porque, nessa toada, vai-se aos templos para falar com Deus e acabam vendo o diabo de perto, ou, o que é pior, apresentando-o àqueles que estão, bravamente, abrindo mão da normalização de suas vida, para poder permanecer como mortai. Respeite, ao menos, a Deusa Themis, símbolo da Justiça.
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