A histeria da vacina na ausência de métodos
Debate focado em vacinas pode custar 250 mil mortes até outubro e mostra que nem Esquerda e muito menos a Direita entenderam nada sobre a pandemia que vivemos.
A vacina funciona e a vacina salva, porém, não a temos. Chegou a hora de discutir medidas realmente eficientes e muito mais urgentes.
O debate nacional está travado sobre as vacinas ignoradas e não compradas pelo governo federal. Muito desse debate se deve a atuação da CPI que avança sobre o tema, porém, esse é um comportamento que já custou milhares de vidas.
A quem ainda não tenha percebido, vale ressaltar que existem apenas duas alternativas eficientes contra a pandemia. Um se chama “lockdown” (o fechamento das cidades) e o outro é a Vacina. Porém, quando se fala em eficiência/eficácia com critérios claros e bem definidos como tempo necessário para acabar com a transmissão do vírus e quantidade de vidas salvas, a única estratégia funcional até agora foi o lockdown.
A escolha do método:
Para deixar esse raciocínio mais óbvio, vamos pensar em uma outra situação:
Imagine que um prédio está pegando fogo, um incêndio que se não for devidamente contido, poderá matar até 2 mil pessoas em apenas um dia.
Quando os bombeiros chegam no incêndio, qual você acha que deve ser o procedimento adotado:
a) Instalar hidrantes, mangueiras e extintores para que cada pessoa no prédio possa combater o fogo;
b) Simplesmente começar a combater o incêndio, sem se preocupar se os esforços serão suficientes para salvar as vidas que ainda se encontram no prédio;
c) Deixar o fogo pegar, até acabar com o prédio, já que se não tem prédio não tem incêndio no prédio;
d) Evacuar todo o prédio, tirando o máximo de pessoas possível do edifício para em um eventual desastre reduzir as perdas.
Não precisa quebrar a cabeça, é uma pergunta retórica, cada uma dessas situações pode ser transferida da realidade do combate ao incêndio, para ser comparada com a realidade do combate à Covid.
Opção A:
A primeira opção listada acima, equivale ao que seria a vacina. A vacina é como extintores, mangueiras, hidrantes e mecanismos de prevenção ao incêndio. É claro que em um incêndio, se cada um tiver um extintor, o coletivo poderá combater o fogo até mais rápido do que a chegada dos bombeiros, porém, a realidade é que nessa pandemia, estávamos vacinados contra uma série de doenças, mas não contra a Covid, seria como em um prédio que só tem extintores líquidos, ocorresse um incêndio em uma mega bateria de lítio, não serve para nada. Água não apaga incêndio de lítio; pó químico e espumas também não.
Opção B:
A opção B das opções de combate ao incêndio, é o que está acontecendo agora com o combate a pandemia. Seria como um bombeiro chegar com apenas um balde, para apagar o incêndio de um prédio inteiro e dissesse: “não se preocupem, podem ficar aí no prédio normalmente, porque já estou com uma parte da água necessária para combater o fogo”.
O que está acontecendo agora? Com pouquíssimas doses de vacinas disponíveis no mundo, com o Ingrediente Farmacêutico Ativo, o famoso IFA, insuficiente para produzir as vacinas necessárias para os 7 bilhões de habitantes na terra. Estamos vacinando as pessoas dentro do incêndio. Pessoas essas, que se acumulam em transportes públicos para irem trabalhar, porque os prefeitos e governadores, agindo como “cúmplices do genocídio”, se recusam a fechar as cidades para salvar vidas.
Opção C:
A 3ª opção citada nesse editorial de combate à incêndios, parece muito tosca para ser citada, mas pense: Qual é a diferença entre essa eventual técnica de deixar o prédio se acabar em chamas e ver quem consegue se salvar sozinho, e a estratégia já defendida pelo governo federal, conhecida como “Imunidade de Rebanho” ?
Não há diferença! Na imunidade de rebanho, estima-se o tamanho do desastre, se dimensiona um provável número de perdas e aceita que muitos morram, sem gerar “prejuízo” para os demais que ficarão assintomáticos.
Em ambos os casos, tanto no incêndio, quanto na pandemia, usar essa tática, além de gerar muitas mortes e perdas, corre-se ainda o risco de nunca atingir essa “imunidade de rebanho” ou esse “fogo auto extinto”, porque além de o incêndio poder se agravar e se espalhar pelos prédios vizinhos, sua queda também pode abalar e comprometer muitas estruturas fundamentais para a sociedade do entorno; no caso da epidemia, a estratégia de rebanho dá errado porque a cada reprodução, a cada nova contaminação, o vírus sofre pequenas modificações genéticas que podem gerar mutações graves. O vírus pode aprender a invadir o sistema imunológico de pessoas que não constavam no cálculo inicial de risco de perdas, como tem acontecido com a faixa etária de 30 a 50 anos, que no início da pandemia não gerava preocupações, mas agora é um dos principais públicos a passar por internações.
Opção D:
Evacuar o prédio para manter o máximo de pessoas possível em segurança é a opção mais lógica e óbvia, é assim que os bombeiros agem em uma situação de incêndio e emergência.
Primeiro evacua o local, isola as pessoas longe do risco, depois combate o incêndio, faz o rescaldo, verifica a situação do edifício e decide se interdita, se manda demolir, se libera para reformas e para os moradores voltarem.
Em um paralelo com o combate à pandemia, seria como o lockdown, o fechamento completo das cidades, a interrupção do transporte público, dos bares, dos restaurantes e de todos os demais comércios não essenciais. Isso significa tirar as pessoas das zonas de risco e conter a rede de transmissão do vírus.
Uma vez encerrada a rede de transmissão, ou seja, uma vez que o incêndio pare de crescer, isso aumenta as chances do nosso sistema de saúde trabalhar para curar aqueles que ainda estão internados. Ainda seguindo o paralelo, depois que o incêndio é controlado, ou seja, a transmissão do vírus chega próxima de zero, aí sim, você faz um rastreio epidemiológico e só então, depois de uma situação segura e controlada é que se reabre as cidades.
Diferenças de desempenho de acordo com o método:
O quadro acima lista uma série de países e seus resultados no combate a pandemia.
Aqueles países que agiram com mais racionalidade e. ao primeiro sinal do vírus, restringiram a circulação da população, fizeram barreiras sanitárias, rastrearam pessoas próximas aos infectados e literalmente travaram a economia, tiveram resultados muito expressivos como China, Vietnã, Nova Zelândia e Austrália; enquanto outras potências mundiais como EUA, Brasil, Itália e Reino Unido optaram pela tática que valoriza mais a economia do que a vida da população. Os resultados não foram bons nem para a saúde da população, nem para a economia.
Enquanto a China, 2ª maior potência econômica do mundo atual, fechou imediatamente todas as regiões com vírus detectado, os EUA, maior economia mundial, liderada à época por Donald Trump, levou seu povo à morte com a ideia de que a população deveria trabalhar e não se preocupar com o vírus.
No Brasil, o gado do Trump (clã Bolsonaro) seguiu o presidente estadunidense e conduziu mais de 460 mil brasileiros à morte com essa estratégia delinquente.
Muitos desses países arrasados pela primeira onda, aprenderam e mudaram o “método primário” de combate a pandemia. Itália, Espanha, Reino Unido e EUA, apesar dos altos índices de mortalidade, mudaram a forma de combate e, também com lockdown e medidas de suporte econômico para a população, conseguiram melhorar e muito o desempenho nas 2ª e 3ª ondas.
Nesse momento agudo da pandemia, com 2.000 mortes diárias, gritar pela vacina como solução para o fim da pandemia é tão ignorante quanto remar em mar aberto tentando encontrar a “borda da terra plana”, não vai acontecer, não há condições de acontecer. Só o lockdown com auxílio econômico alto suficiente para manterem as famílias bem alimentadas e seguras em casa, será capaz de salvar as vidas e a economia brasileiras.
Nos EUA, por exemplo, famílias estão recebendo em auxílio do governo, um valor até 50% maior que o salário mínimo nacional. São aproximadamente US$ 2.000 dólares mensais para as famílias se manterem alimentadas e seguras em meio às incertezas da crise, enquanto no Brasil o presidente debocha da população com um auxílio emergencial de apenas R$ 150,00 (US$ 30,00) por mês, um valor ridiculamente insuficiente para convencer as pessoas a ficarem em casa.
A vacina é importante, mas o lockdown é fundamental:
A vacina é sim útil, tal qual os sistemas anti-incêndio que devem ser instalados antes do incêndio acontecer. Porém, para isso é preciso evacuar o prédio, salvar as pessoas, apagar o incêndio e na reforma do prédio instalar a “vacina” contra incêndios futuros.
Isso, de forma alguma, é ser contra a vacina. A vacinação deve continuar paralelamente ao lockdown, mas é, sim, uma questão matemática, basta fazer um exercício de imaginação bem otimista para ver o quão infantil e genocida é a a ideia de que a vacina sem lockdown evitará um desastre ainda maior.
Observe:
Se tudo der certo e a produção de vacinas não sofrer nenhum novo atraso ou interrupção por falta de IFA, autoridades sanitárias garantem que o SUS tem capacidade de aplicar até 2 milhões de doses por dia – embora a média nos primeiros 125 dias de vacinação foi de apenas 540 mil doses por dia e o melhor dia de vacinação não chegou a 1,8 milhão de doses.
Nessa hipótese, a aplicação otimista, com 2 milhões de doses por dia, levaria 135 dias, com essa força total, para imunizar os 125 milhões de brasileiros que faltam para a marca de imunização mínima que é de 70% da população.
Se durante esse período for mantida uma média de mortes, semelhante à média móvel atual, 1.835, significará a morte de mais 250 mil pessoas até o dia 13/10/2021. Se morrer a mesma quantidade de pessoas que morreu nos últimos 135 dias, então 260 mil vidas serão perdidas.
Lembrando que isso é um cálculo otimista. Esse editorial não fala contra a vacina, pelo contrário, fala a favor da racionalidade, da matemática básica, da eficiência máxima das medidas de reação a crise e, principalmente, fala sobre a única forma de poupar a vida dos brasileiros que têm, sistematicamente, sido vítimas das, cínicas, políticas públicas de enfrentamento à crise que fingem se importar com as mortes, mas apenas privilegiam os pleitos de comerciantes e empresários com medo de perder rendimentos e um eventual lockdown.
O que mais se vê em protestos dos tais “70%”, que nós somos, é a cobrança por vacina, mas isso é uma manifestação infantil e errada, no momento em que a única coisa que deveria importar é um lockdown/fechamento rígido por 90 dias, ou no mínimo 45 dias, com auxílio emergencial justo e razoável para todos os habitantes que necessitem.
Lockdowns de 7, 10, 15 e 20 dias, com reabertura com base em marcas altíssimas de ocupações nos leitos, não deveria se chamar lockdown, mas sim estratégia de marketing político. “Necromarketing” político.
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